Todas as famílias experimentam crises. As crises são uma parte natural do desenvolvimento das
pessoas e, também, das famílias. Elas podem ser previsíveis, como a chegada de um bebê, o início
da vida escolar dos filhos, ou o ninho vazio. Diante delas, podemos preparar-nos antecipadamente, por exemplo, assistindo a palestras, lendo manuais ou buscando conselhos com outros que já passaram por situações semelhantes.
No entanto, outras crises são imprevistas ou inoportunas para as famílias, como a doença de um filho, um desastre natural ou a morte de um dos pais. Diante delas, sentimo-nos desprotegidos e abalados, pois elas podem esgotar completamente nossas estratégias de enfrentamento, assim
como nossos recursos econômicos, sociais e espirituais.
Pandemia
O contexto da pandemia de Covid-19 trouxe crises inesperadas para as famílias. O enfrentamento delas exigiu a adaptação de cada um de seus membros a uma “nova normalidade”. As regras de convivência, os papéis familiares, a distribuição dos espaços dentro de casa, bem como o tempo
que compartilhamos e os hábitos diários mudaram. Cada família teve de recorrer a seus pontos fortes para sobreviver.
E, claro, as deficiências e carências pré-existentes no sistema familiar também vieram à tona.
Muitas famílias foram levadas ao extremo da tristeza, tensão e perplexidade diante do incontrolável, vendo como suas economias, estabilidade no emprego e projetos familiares se diluíam, colocando sua fé à prova. Nessas circunstâncias, os membros de uma família podem sentir solidão, desesperança, raiva, ansiedade, esgotamento frustração, estresse ou mesmo depressão.
Não obstante, no desafio de superar uma crise, as pessoas e as famílias podem encontrar oportunidades de crescimento e desenvolvimento. Mesmo as crises mais extremas podem trazer oportunidades de uma mudança positiva nas relações familiares, como a reconciliação e o fortalecimento da unidade no lar. Para isso, é necessário superar as fases de choque, negação, resistência à mudança ou mau humor decorrente da transformação repentina da realidade, dando lugar, progressivamente, à adaptação e reorganização familiar.
Epstein, Bishop e Baldwing (1982), falam de pontos fortes que sustentam as famílias em momentos de crises. Isso permite a elas conservar a unidade, ser resilientes e superar a dor e as perdas. Manter e desenvolver esses pontos fortes evita a deterioração das relações familiares, e as feridas emocionais que surgem das crises nos projetam para o futuro com confiança. Elas são:
Comunicação.
Se houver abertura entre todos os membros da família para expressar ideias, sentimentos e experiências diárias, de forma direta e clara, cada um se sentirá confiante e livre para conversar sobre o que o preocupa ou alegra. Assim, o grupo familiar torna-se o contexto mais seguro e empático
para descarregar as tensões e recuperar o bom humor.
Contenção e afeto.
Quando um membro da família tem um problema, os outros estão prontos a escutá-lo com atenção e dar apoio, sem cair no ridículo ou desvalorização de seus sentimentos. A contenção também implica demonstrar carinho, como dar as mãos, dar um abraço, fazer carinhos ou dedicar tempo para consolar e animar nossos familiares.
Previsão.
As famílias que planejam, economizam e preveem o fornecimento de alimento, dinheiro, roupas e abrigo experimentam menos tensões diante de uma eventualidade e resolvem conflitos emocionais e crises de forma mais eficaz.
Funções e tarefas. A desorganização familiar gera tensão.
Portanto, as famílias mais funcionais têm uma distribuição razoável e equitativa das várias tarefas que existem dentro de uma casa. Essas responsabilidades são compreendidas, aceitas e cumpridas favorecendo a harmonia, a higiene, a ordem e o bem-estar.
Vida espiritual forte
. White (2007), explica que as dificuldades são inevitáveis para toda a humanidade, e é no
lar que aprendemos a desenvolver a paciência, a gratidão e o amor genuíno, mesmo nos dias mais incertos. Os hábitos como o culto familiar e a devoção pessoal, em que o Criador
é louvado, onde as promessas divinas são revisadas, assim como os eventos finais estudados, podem aumentar nossa fé e afastar a incerteza, gerando um clima familiar de esperança e otimismo.
Assim como encontramos pontos fortes nos hábitos familiares, também existem práticas que dificultam o enfrentamento das crises:
Egoísmo.
Significa cuidar dos próprios interesses deixando de lado o altruísmo e a empatia. Diante de uma crise, as pessoas podem cair na tentação de buscar seu próprio bem-estar e conforto, mesmo às custas dos outros membros da família.
Desintegração.
Comportar-nos como pais, mães ou mesmo filhos ausentes ou indiferentes leva ao enfraquecimento da
unidade familiar. A desorganização de papéis, as relações caóticas e a negligência em atender às necessidades familiares reduzem a força do sistema familiar para enfrentar as crises.
Problemas não resolvidos.
Os conflitos que não são resolvidos no momento certo, mas adiados ou ignorados geram um
clima perturbador e de desconfiança para a família resolver seus problemas atuais e futuros. As famílias funcionais resolvem seus problemas a tempo, sem adiá-los e nem os transferir para quem não corresponde. Não se trata de não ter problemas, mas de evitar que eles se acumulem, se tornem mais complexos ou se enraízem como parte da convivência.
Rigidez.
Sair de nossa zona de conforto quando vemos nossas rotinas alteradas pode produzir medo e um sentimento e rejeição. Isso pode nos levar a uma estagnação e a nos agarrarmos inutilmente a um passado que não voltará.
Embora leve tempo para assimilarmos as perdas e nos ajustarmos às novas realidades, é importante colocarmos nossa confiança em Deus e nos reestruturarmos rapidamente e funcionalmente.
Hoje enfrentamos uma crise de saúde mundial, mas sabemos que virão outras crises, e nossa família precisa estar preparada e fortalecida. Cristo oferece-nos Sua ajuda e fará, em favor de cada família, o que está além de suas forças, para sair vitoriosas aqui, mas, ainda mais, para ganhar a vitória
final.
“Não temas, porque eu sou contigo; não te assombres, porque
eu sou o teu Deus; eu te fortaleço, e te ajudo, e te sustento com minha destra fiel” (Isaías 41:10).
Referências:
1 Ellen G. White. O Lar Adventista. Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2009.
2 N. Epstein, D. Bishop e L. Baldwin. The McMaster Model of Family
Functioning: A view of the normal family. In: F. Walsh (ed.) Normal Family
Processes. New York: Guilford Press, 1982, pp. 15-141.
Quinteros de Vallejos, é Coordenadora
do curso de Psicologia da UPEU – Tarapoto