Semana de Mordomia Cristã
“Vinde, vede um homem que me disse tudo quanto tenho feito.
Porventura não é este o Cristo?” (João 4:29).9
Se houvesse uma imprensa local, um jornal anunciando os eventos mais importantes na região de Samaria, acho que um artigo teria aparecido com o título “Reavivamento em Samaria”.
Tal artigo teria sido elaborado nos dois dias que Jesus passou em Nazaré, na cidade de Sihar, com Seus discípulos. Teria sido um evento extraordinário devido às tensões e ódio que existiam entre os judeus e os samaritanos. Nenhum judeu respeitável teria feito tal coisa. O artigo descreveria como Jesus se tornou conhecido entre os samaritanos, bem como o importante papel que uma mulher, cujo nome não sabemos, desempenhou neste caso. Naquela época, não existiam os meios de comunicação que temos hoje. Mas o evento que aconteceu nos subúrbios da Judéia foi real. As pessoas envolvidas eram pessoas reais, e há séculos que se fala dessa mulher. Ela pode ser considerada uma das missionárias mais bem-sucedidas da Bíblia porque conheceu o maior missionário da humanidade, Jesus Cristo. Não vamos esquecer, tudo começou com uma coisa muito simples: um
copo de água.
Jesus Cristo, o Grande Missionário
Há um medo do qual não falamos, embora esteja presente e domine a vida de muitos que se dizem crentes — o medo de testemunhar. O medo pode ter muitas causas: podemos não saber o que dizer, não estamos convencidos de que é nosso dever ou percebemos que pode mudar a vida de alguém para sempre.
No Evangelho de João, um capítulo inteiro é dedicado ao encontro de Jesus com a mulher samaritana junto ao poço de Jacó (Jo 4). João, o evangelista, após apresentar o encontro de Nicodemos com Jesus durante a noite no terceiro capítulo, continua a descrição do encontro de Jesus com a mulher samaritana como uma demonstração do versículo mais importante da
Bíblia, que diz que “quem” acredita que pode ter vida eterna (Jo 3:16).
Essas duas pessoas, Nicodemos e a mulher samaritana, são os dois extremos de todo o espectro da religiosidade. Ninguém pode ser tão bom que não precise de um nascimento do alto; mas, ao mesmo tempo, ninguém está tão longe que a graça de Deus não possa recuperá-lo. O evangelho é para os iníquos e também para aqueles que se consideram bons.
Jesus Cristo também é nosso modelo de missão e evangelismo. Todo o capítulo é dominado por surpresas. A mulher fica surpresa com o pedido de Jesus. Ela nunca viu tal coisa (Jo 3: 9) — um judeu se dirigindo a uma mulher samaritana. Os discípulos ficam surpresos porque o Mestre está falando com uma mulher (versículo 27). Por sua vez, os habitantes da cidade ficam surpresos com as palavras da mulher e passam a ver Jesus com os próprios olhos. A maior surpresa é a mudança que ocorre na vida dessa mulher. Não sabemos quanto tempo Jesus passou no poço com
essa mulher. João nos apresenta apenas um resumo do diálogo, mas há muitas coisas que podemos aprender com ele.
Em primeiro lugar, a intenção de Jesus é salvar almas. Temos dados geográficos exatos e contexto histórico, mas João sempre nos dá detalhes que destacam aspectos menos percebidos pelos desatentos. Jesus, diz João, “precisava” passar por Samaria (Jo 4:4) em Seu caminho de Jerusalém para a Galiléia. Embora mais curta, essa estrada geralmente era contornada pelos judeus justamente para evitar qualquer encontro com os samaritanos. Jesus tinha a agenda de cada dia, como nós a temos.
Todos os dias, ele pedia a aprovação de Seu Pai celestial, bem
como orientação para as ocasiões preparadas. O Céu ainda prepara oportunidades para aqueles que desejam ser usados por Deus hoje.
Em segundo lugar, Jesus supera todas as barreiras — étnicas, religiosas, raciais e culturais, bem como os preconceitos levantados por ambos os lados — ao iniciar o diálogo e pedir um favor: água, porque Ele estava com sede. Embora os samaritanos acreditassem nos primeiros cinco livros da Bíblia, eles eram considerados pelos judeus como sendo piores do que os
pagãos, porque poluíam a raça pura dos patriarcas ao se misturarem com os gentios. O vaso de água que a mulher possuía era considerado sujo, e sua própria comunidade a considerava imoral. É por isso que ela estava sozinha: ninguém queria sua companhia. Por meio do pedido “dê-Me de beber”, Jesus honra essa mulher e dá-lhe dignidade. Ele a trata como uma pessoa responsável, respeitável, capaz de uma discussão teológica.
Ele lhe fala sobre a água viva, a adoração verdadeira, o templo verdadeiro. Ainda mais, ela está pronta para a descoberta mais nobre: Sua identidade. “Eu o sou, eu que falo contigo” (Jo 4:26), isto é, o Messias.
Jesus a ajuda a descobrir a maior necessidade de sua vida: a necessidade de limpeza e perdão. Ele a convence de que pode ler os segredos mais escondidos de sua vida, de que nada pode ser escondido. Lá, no fundo de sua alma, estava um capítulo doloroso e sujo, o sexto homem, que não era seu marido. Jesus sabia que essa mulher ansiava por amor, realização, compreensão e aceitação, e o poço do qual ela tentava satisfazer sua sede
de alma estava envenenado.
A mulher viu o rosto de Jesus e entendeu por Suas palavras
que Ele não a estava condenando, mas, sim, expressando misericórdia e amor. A graça de Deus, a água viva, é derramada no coração dessa mulher, que deixa o vaso e corre para a cidade. Ela tem uma mensagem para todos os samaritanos, e sua mensagem é: “Vinde, vede um homem que me disse tudo quanto tenho feito” (Jo. 4:29). “Ele sabe tudo sobre mim, e ainda me
tratou com respeito e amor como nenhuma outra pessoa na minha vida.”
Novamente, João adiciona um detalhe — a mulher deixou seu vaso no poço — mas ele não explica por quê. Talvez ela tenha deixado para Jesus beber algo, ou pretendia voltar de qualquer maneira. O vaso vazio também pode ser um símbolo de seu vazio interior. Morris, por outro lado, prefere outro significado que eu gosto muito: “Ela deixou de trazer água para trazer pessoas”.
Essa mulher pode ser considerada uma missionária? Ela estava pronta para um trabalho tão importante? Aqui, João enfatiza a missão de uma pessoa engajada no evangelismo. Não é converter pessoas; esta é a obra do Espírito Santo. Ela teve sua própria experiência ao conhecer Jesus, seu próprio testemunho e fez uma coisa: apresentou Jesus às pessoas. “Vinde, e vede”,
uma expressão que é repetida neste Evangelho (Jo 1:39, 46).
A “Comida” de Jesus
Na ausência da mulher, os discípulos pedem a Jesus que coma, mas Jesus Se recusa, dizendo que tem algo para comer que eles não sabem (Jo 4:32). Nesse caso, eles se perguntam se alguém trouxe comida para Ele. No Evangelho de João, encontramos dois níveis de realidade. O primeiro é o físico, que pode ser visto e conhecido; mas Jesus sempre volta os olhos dos ouvintes para outra realidade, a espiritual, que só pode ser identificada
e vista pela fé. No capítulo 2, ele fala sobre o templo espiritual,
Sua própria pessoa, no qual todas as pessoas têm a oportunidade de encontrar Deus; mas os fariseus e mesmo os discípulos não entendem Suas palavras. Nicodemos reage ao imperativo de Jesus, “Você deve nascer de novo”, perguntando como isso é possível, e Jesus o corrige apontando para o nascimento espiritual (Jo 3:25). Os discípulos também não entendem as palavras de Jesus sobre a comida especial que Ele recebeu por meio de Seu diálogo com a mulher samaritana.
Jesus continua: “A minha comida é fazer a vontade daquele que me enviou, e realizar a sua obra” (Jo 4:34). Ninguém falava assim.
Este capítulo nos ajuda a olhar novamente para o coração de Deus, que é a prioridade do Céu. A Bíblia inteira nos fala sobre um missionário, Deus, que busca apaixonadamente os perdidos.
A missão não é nossa; não é da igreja, mas de Deus. É parte da própria natureza de Deus. Ele é o protagonista da missão. Não temos um Deus que nos envia primeiro, pois Ele Se permite ser enviado e fala sobre isso repetidamente no Evangelho de João. A obra de Jesus é oferecer vida eterna; é a obra que o Pai Lhe confiou (Jo 17: 2-4), e o envolvimento nesta missão dá a Ele a maior satisfação. Ele foi fortalecido pelo testemunho, e Sua alegria foi completa quando Ele encontrou almas sedentas. Mesmo na cruz de madeira, quando a agonia da morte tomou posse de Seu ser,
Ele foi consolado pelo último testemunho que deu ao ladrão ao Seu lado. O grito “tenho sede” é um eco da busca de Deus, do desejo de salvar o maior número de almas possível.
Todas as pessoas são amadas por Deus e incluídas na obra de salvação. Deus ama o mundo como um todo e cada pessoa individualmente (Jo 3:16). Há uma fome e sede espiritual de Deus em nossos corações, um vazio em cada alma, mas muitos, como a mulher em Samaria, ainda não sabem onde essa necessidade pode ser atendida. Por causa do pecado, entretanto, todas as pessoas mostram resistência ao chamado de Deus, e é por isso
que o Espírito de Deus luta com todas as almas. A resistência pode ser vista no diálogo da mulher com Jesus. Ela não estava disposta a abrir seu coração, mas Jesus gentilmente a conduziu à fonte de água viva. Até nós mesmos frequentemente resistimos à mensagem divina, e o Espírito Santo continua a trabalhar em nossos corações. É doloroso que alguns continuem a mostrar resistência o tempo todo. Jesus nos avisou que a semente
pode cair em solo não preparado. Mas mesmo nessas situações, quem não aceita a mensagem não nos rejeita, mas, sim, Aquele que os ama e quer salvá-los.
Pronto para a Colheita
O efeito do testemunho dessa mulher é visto na multidão de pessoas indo ao lugar onde Jesus está. Todas essas pessoas vêm não para ouvir um sermão, mas para ver um sermão vivo na pessoa do Salvador. Ellen White capta a maior necessidade da humanidade nas seguintes palavras: “O mundo necessita atualmente daquilo que tem sido necessário já há mil e novecentos anos — a revelação de Cristo. É preciso uma grande obra de reforma, e é unicamente mediante a graça de Cristo que a obra de
restauração física, mental e espiritual se pode efetuar”10.
Jesus usa imagens agrícolas para descrever o interesse demonstrado pelo povo de Sicar. “Não dizeis vós que ainda há quatro meses até que venha a ceifa? Eis que eu vos digo: Levantai os vossos olhos, e vede as terras, que já estão brancas para a ceifa!” (Jo 4:35). Segundo a parábola, o semeador que saiu a semear é o próprio Jesus Cristo; mas no Evangelho de João, Ele não é apenas o semeador. Ele também é o grão que deve morrer para dar muito
fruto (Jo 12:24). Ele é a semente da mulher na primeira promessa
da Bíblia (Gn 3:15), e a madeira da cruz é o lugar onde a Semente morre não apenas para ressurgir em glória, mas para ver o fruto de Seus sofrimentos (Hb 12:2)
O trabalho mais difícil não é nosso; foi e é Seu trabalho, mas todos os discípulos são chamados a participar da grande colheita. A colheita sempre foi uma ocasião de alegria e toda a comunidade se envolveu nessa atividade (Rt 1:22).
Na natureza, existe uma ordem que Deus estabeleceu: é um tempo para preparar o solo, um tempo para semear e um tempo para colher os frutos. Usamos essas imagens para descrever o longo e difícil processo pelo qual a igreja está envolvida em ganhar almas. Às vezes, mesmo quatro meses (versículo 35), de
acordo com a aplicação de Jesus, não são suficientes para preparar as almas para entrarem em uma aliança com Deus por meio do batismo.
Porém, no relato de João, o tempo é comprimido. No mesmo dia da semeadura, ocorre também a colheita. É o que o profeta Amós profetizou: que viria o dia “em que o que lavra alcançará ao que sega” (Am 9:13). A cidade inteira está em movimento. As pessoas não vêm apenas para ver Jesus; pedem a Ele para ficar com elas, e Jesus Cristo passa dois dias com elas. Não nos surpreendemos que depois da Ressurreição, após a pregação
do evangelho em Jerusalém e na Judéia, Samaria esteja pronta para a mensagem de Filipe (At 8). Os samaritanos reconhecem na pessoa de Jesus o Salvador do mundo (Jo 4:42), uma expressão que encontramos apenas uma vez na Bíblia (1Jo 4:14).
Gostaríamos de saber o que Samaria representa hoje. Onde Jesus deseja ser conhecido e quais são as barreiras que precisam ser superadas? Mesmo hoje, todos defendem sua religião, suas formas, rituais e montanhas (Jo 4:20). Podemos ter nossas próprias montanhas, enclaves nos quais recuamos, e esquecer o mundo ao nosso redor. À pergunta “Samaria está pronta para a mensagem do evangelho?”, qual teria sido a resposta dos discípulos? E os discípulos de hoje? As pessoas não precisam apenas
mudar de religião; elas precisam ver Jesus. Deus pode usar as ferramentas mais simples, como uma mulher com um passado duvidoso que conheceu a graça do perdão.
No capítulo “Junto ao Poço de Jacó” do livro O Desejado de Todas as Nações, Ellen White diz: “Todo verdadeiro discípulo nasce no reino de Deus como missionário”11. O evangelho é para “todo aquele que crê”, e todo aquele que recebe o evangelho, as boas-novas — Jesus Cristo — naturalmente se torna um missionário. Essa é a honra que Deus quer dar a cada um de nós.11 Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações, p. 128.
Perguntas:
- Quais são as semelhanças entre a mulher samaritana e a
sociedade atual? - O que podemos aprender com o método de evangelização
de Jesus? - Quais são os desafios dos discípulos de hoje? Até que ponto estou disposto a ser guiado por Deus a cada dia para
as oportunidades de testemunho que Ele prepara?