Sem Compromisso na Babilônia

Semana de Mordomia Cristã


“E Daniel propôs no seu coração não se contaminar com a porção das iguarias do rei, nem com o vinho que ele bebia;
portanto pediu ao chefe dos eunucos que lhe permitisse não se contaminar” (Daniel 1:8).5
Muitas vezes temos a impressão de que colocar Deus em primeiro lugar se refere apenas à vida religiosa e não à nossa vida no mundo do trabalho. Por outro lado, a religião da Bíblia é prática; penetra todas as esferas da existência e tem a ver com todo o ser humano. Às vezes, até mesmo o povo da Bíblia não colocava Deus em primeiro lugar e fazia concessões. Sua
lista é bastante longa e inclui nomes como Eva, Adão, Abraão, Moisés, Salomão, Elias e Pedro, para citar apenas alguns. A lista dos intransigentes não é tão longa e inclui antes de tudo Jesus, o modelo perfeito, seguido por José; Daniel; Os amigos de Daniel, Hananias, Misael e Azarias; bem como alguns outros.


Identidade e Integridade
Nabucodonosor, rei da Babilônia, e seus soldados cercaram Jerusalém, conquistaram-na e levaram os vasos do templo. Nabucodonosor também fez reféns, incluindo Daniel e seus amigos (Dn. 1:3-5). O propósito principal pelo qual foram levados para a Babilônia era servir a Babilônia de dentro. Eles deveriam ser treinados na “Universidade da Babilônia”, conhecer a cultura da Babilônia, ficar impressionados com sua beleza e grandeza
e servir aos seus interesses. A escravidão sempre tem dois riscos: o primeiro é o isolamento. É muito mais fácil manter sua fé, valores e cultura quando você se tranca em um enclave. A mensagem de Deus por meio do profeta Jeremias era para não se isolar, estar presente na vida da Babilônia e mostrar que se tem um Deus e esperança (Jr. 29). O outro risco é o da assimilação.
Foi o que se tentou com esses jovens judeus. Chegando à Babilônia, seus nomes foram alterados, porque seus nomes originais apontavam para a identidade de sua religião e seu Deus. A filosofia da Babilônia dá continuidade ao desejo dos construtores da torre de Babel de se tornar um nome.
Mesmo para muitos hoje, sua condição educacional ou financeira é uma forma de se tornar um nome. Abraão, chamado por Deus, deixou a Babilônia com a confiança de que Deus manteria Sua palavra e tornaria grande Seu nome (Gn 12:2), uma
bênção para todas as nações. A Babilônia entra em colapso, um
novo reino segue, e o novo rei, Dario, clama a Daniel ao se aproximar da cova, chamando-o pelo seu nome judeu, que permanecerá para sempre. “Daniel, servo do Deus vivo, dar-se-ia o caso que o teu Deus, a quem tu continuamente serves, tenha podido livrar-te dos leões?” (Dn 6:20). A cova com leões em que Daniel foi colocado, bem como o forno quente sete vezes mais aquecido onde os três amigos foram atirados, mostram que eles não
perderam a identidade. Os nomes podiam ser mudados, mas o coração não.
Esses jovens também foram expostos à educação babilônica, que videntemente continha mais do que aprender novas línguas necessárias para servir ao reino no mais alto nível. Eles tinham um conhecimento completo da Palavra de Deus. É por isso que eles podiam filtrar e distinguir a verdade da mentira.
O processo de assimilação não parou nos nomes e no desenvolvimento intelectual, mas também atingiu outros aspectos da vida mais pessoal, incluindo a alimentação. A Babilônia queria mudar seu estilo de vida, que tinha grande potencial para destruir sua identidade.
Comer a comida servida à mesa do rei contradizia a dieta que Deus tinha claramente estabelecido por lei (Lv 11). O propósito dos mandamentos com relação à comida, assim como toda a lei judaica, era a santificação, a preservação da identidade como povo de Deus.


Consistente com o Estilo de Vida
Daniel e seus amigos não tiveram escolha em algumas coisas: sua deportação para a Babilônia, a mudança de seus nomes, sua preparação intelectual e sua escolha de comida.
Longe de casa, escravos em um país estrangeiro, esses jovens estavam sob enorme pressão. Apesar de tudo isso, eles decidiram não se contaminar (Dn 1:8) com as iguarias do rei e o vinho de sua mesa. A linguagem tem conotação religiosa e tem a ver não apenas com as leis nutricionais delineadas em Levítico 11, mas também com o fato de ser servida em um ambiente ritual, no qual o rei era considerado um deus. Ao pedir verduras
e água, Daniel se referia ao alimento estabelecido no princípio
por Deus para o homem (Gn 1:29), e ele afirma implicitamente que Deus, não o rei, é o Criador.
Existem três coisas que a Bíblia chama de abominação diante de Deus: idolatria, comida impura e promiscuidade. Os rapazes decidiram não aceitar concessões em relação a nada disso.
A teologia da alimentação já está presente nas primeiras páginas da Bíblia porque o primeiro mandamento que encontramos em Gênesis diz respeito à comida e à árvore proibida (Gn 2:16, 17). O primeiro teste no qual Adão e Eva tiveram que passar incluía um componente alimentar, e isso se repetiu na vida de Jesus, quando o diabo O tentou no deserto para transformar pedras em pão.
Junto com seus amigos, Daniel sabia que eles precisavam testemunhar para seus colegas e todos os babilônios. Então, eles optaram por ir além da dieta hebraica típica. Eles escolheram uma comida vegetariana. Quem quer evitar qualquer transigência não se contenta com o limite da lei. Eles escolheram o mais alto e melhor padrão.
Às vezes, as pessoas ao nosso redor não estão tão interessadas em nossas crenças, mas não podem ignorar nosso estilo de vida. A maioria das discussões sobre a Bíblia e religião é motivada por nosso estilo de vida diferente.
Aprendemos com Daniel que a religião não se limita ao teórico e abstrato; vai mais fundo, ao nível prático da vida diária.
A religião também tem a ver com a maneira como cuidamos de nosso corpo.
Daniel pediu a Aspenaz, o chefe dos eunucos, que permitisse que ele e seus amigos subsistissem de dieta vegetariana por dez dias, assumindo assim o risco da fé de que esses jovens estavam passando brilhantemente.
O teste final ocorreu três anos após a formatura, quando o rei “os examinou” e “os achou dez vezes mais doutos do que todos os magos astrólogos que havia em todo o seu reino” (Dn 1:20).


Três vezes no primeiro capítulo do livro de Daniel, a intervenção de Deus ocorreu. Primeiro, Deus entregou Jeoaquim, o rei de Judá, nas mãos de Nabucodonosor (Dn 1:2). Em seguida ele trouxe Daniel “para o favor e boa vontade” de Aspenaz. Na terceira vez, “ Deus lhes deu o conhecimento e a inteligência em todas as letras, e sabedoria; mas a Daniel deu entendimento em toda a visão e sonhos” (Dn 1:17).


O principal tema que frequentemente surge no livro de Daniel é a vitória e a libertação. O livro começa com um período de angústia local e termina com a grande tribulação, mas também a grande libertação. A vitória do primeiro capítulo, quando Deus dá sabedoria a esses jovens, nada mais é do que um prelúdio para o que se segue. Essa vitória foi possível porque eles
“decidiram” permanecer consistentes em sua fidelidade a Deus, mesmo nas coisas que podem parecer pequenas para alguns. E Deus honrou sua fidelidade dando-lhes sabedoria. Os sábios, de acordo com o livro de Daniel, brilharam nas trevas da Babilônia, e a promessa é que brilharão para todo o sempre (Dn 12:3).


Um Estilo de Vida para o Tempo do Fim
Em Seu último sermão sobre o tempo do fim, Jesus recomendou o estudo do livro de Daniel (Mt 24:15). Seu estudo levou ao nascimento do movimento adventista e da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Não devemos esquecer, porém, que se Deus não tivesse intervindo para mudar o estilo de vida de nossos pioneiros, esse movimento poderia ter morrido de tão debilitada
saúde que eles tinham. Sem a mensagem de saúde, não seria o que é hoje, uma igreja mundial com uma mensagem profética.
Em 1848, Ellen White teve sua primeira visão dos efeitos nocivos do tabaco, do café e do chá. Demorou quase dez anos para a igreja ser limpa do vício do tabaco e do fumo. A próxima visão, em 1854, é sobre higiene corporal, ordem e limpeza nas casas.
Em seguida, vem uma das visões mais influentes, em 6 de junho de 1863, em Otsego, Michigan, quando Ellen é apresentada aos princípios de um estilo de vida saudável e ao fato de que os cuidados com a saúde fazem parte do evangelho.
Para viver, o ser humano precisa primeiro destas funções vitais: batimento cardíaco, respiração, digestão e assimilação de alimentos. Podemos chamar essas funções vitais de sistema de suporte da vida. Podemos cuidar desse sistema para manter e até melhorar seu desempenho. Mas funcionamos em um nível ainda mais alto, o intelectual ou mental, e por meio do cuidado
adequado, podemos ter um pensamento claro e correto. Deus nos criou maravilhosamente. Não temos apenas a dimensão física, mas temos as dimensões emocionais e intelectuais. Ele também acrescentou um nível ainda mais alto, o do julgamento moral e espiritual. Se nos perguntarmos qual dos níveis acima é o mais resistente à violação, a resposta, é claro, é o físico. Seu desempenho é notável. Há muitos que não apenas negligenciam
cuidar de seu físico, mas também abusam dele por meio do uso de substâncias muito prejudiciais. O nível intelectual é menos resistente à violação, mas o mais sensível é o moral e espiritual. Existe uma conexão estreita entre todos esses níveis. Eles influenciam um ao outro. Ellen White disse: “Entre a mente e o corpo existe uma relação misteriosa e maravilhosa”6
.
Para enfatizar ainda mais a necessidade de cuidar do corpo físico, Ellen White acrescenta: “A saúde do corpo deve ser considerada essencial para o crescimento na graça e a aquisição de um temperamento equilibrado”7
.
A profecia bíblica, expressa em linguagem poética, descreve o cardápio daquele que se tornaria Emanuel: “Ele comerá coahada e mel até a idade em que saiba rejeitar o erro e escolher o que é certo” (Is 7:15). Lembramos a metáfora que descrevia Canaã, a terra onde manavam “leite e mel”, mas essa metáfora expressa a linguagem da época, que neste país se encontra tudo o que é necessário. E no caso de Jesus, uma dieta saudável e completa influenciaria o pensamento correto e o discernimento moral. Temos os sentidos com os quais podemos conhecer a realidade externa. Para conhecer a realidade espiritual, precisamos da Palavra de Deus, mas também da presença do Espírito Santo, seu Autor. Essa comunicação ocorre no nível intelectual.
Os hábitos alimentares e de bebida não saudáveis tornam a voz de Deus cada vez mais difícil de ouvir (Is 30:21).
Outra citação dos escritos de Ellen White enfatiza esta verdade: “Todos os que dizem ser seguidores de Jesus devem sentir o dever de preservar seu corpo nas melhores condições de saúde, a fim de que sua mente fique clara para compreender as 6 Ellen G. White, Testemunhos Para a Igreja, vol. 3, p. 485. 7 Ibid., vol. 9, p. 159.32 coisas celestiais”8
.
Deus nos deu um manual de instruções sobre o funcionamento do corpo, e não devemos apenas conhecê-lo, mas também colocá-lo em prática. Precisamos dos alimentos mais saudáveis, ingeridos nos momentos apropriados e nas quantidades certas, exercícios físicos, água suficiente, ar puro, luz solar, sono adequado e, principalmente, confiança em Deus. O objetivo de uma vida saudável não é principalmente uma vida mais longa,
mas viver para a glória de Deus e fazer o trabalho que lhe foi confiado da melhor maneira possível, como Daniel fez.
Não nos esqueçamos: um estilo de vida em harmonia com os princípios da Bíblia é o melhor testemunho, e, para tal, precisamos da graça de Deus. Isso significa colocar Deus em primeiro lugar em nossas vidas. O mundo de hoje precisa de pessoas que possam dizer não ao compromisso, assim como Daniel e seus amigos fizeram.

Perguntas:

  1. Quais são aquelas concessões em sua vida que colocam
    seu estilo de vida em desarmonia com os requisitos de
    Deus?
  2. Que lições de estabilidade podemos aprender com a vida
    de Daniel?
  3. Quais são as decisões que você deseja tomar em relação
    a um estilo de vida para a glória de Deus e o cumprimento da missão que lhe foi confiada?
    8 Ellen G. White, Testemunhos Para a Igreja, vol. 2, p. 522